GALÉ DA DOR
Joaquim Bonifácio Gomes de Siqueira
Noite. No céu trevoso, inquieto e vaga,
Vésper somente, a pelejar cintila...
E lágrimas de luz a luz destila,
Enquanto a treva as solidões alaga...
Ó noite triste, plácida e tranquila!
Por tua paz na terra se propaga
A voz das cousas mortas, voz pressaga,
Que tremo eu próprio, ao entendê-la e ouvi-la...
E enquanto dorme tudo – homens e cousas,
Enquanto, ó minha amada, tu repousas
Na paz das almas sãs, imaculadas,
Como um galé que sombra atroz persegue,
Sinto que a dor, na treva, a espiar-me segue
Seus passos pelas urzes das estradas.
(LETRAS ANAPOLINAS, ANTOLOGIA, PÁGINA 258)