segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

O HOMEM E SEU DESTINO ÚLTIMO

 



O HOMEM E SEU DESTINO ÚLTIMO.

Mário Ribeiro Martins*




A base de todos os sistemas filosóficos através dos tempos tem sido a vida do homem, seu lugar no mundo, sua procedência e seu destino ultimo. Mesmo daqueles sistemas que, denominando-se cosmológicos, pretendiam pesquisar mais a essência da estrutura do mundo do que a situação do homem dentro dele.
Segundo Protágoras, “o homem é a medida de todas as coisas”. Segundo Sócrates, “o homem é o objeto mais direto da preocupação filosófica”.
Quando a metafisica antiga pergunta pelo ser, está formulando ao mesmo tempo uma interrogação acerca do homem. Perguntar pelas coisas, em ultima analise, é perguntar também pelo homem que do mundo faz parte. É a coisa que diz o que as demais coisas são e por meio da qual estas e ela própria conseguem adquirir consciência de sua existência e de sua verdade.
Mesmo as escolas que, como o ESTOICISMO e o NEOPLATONISMO se voltam para uma dissolução do homem na natureza, revelam, na verdade, extraordinária preocupação com ele. Para o CRITICISMO, por exemplo, o homem transcende o mundo, sendo alguma coisa que não é tão somente superior ao mundo, mas também radicalmente distinto dele.
O RACIONALISMO moderno encara o homem como o ser pensante por excelência, como a razão que compreende e explica o mundo e também a si mesmo. Parte da afirmativa de Descartes: “Penso, logo existo”.
Diferentes teorias explicam esta ou aquela particularidade do papel do homem no Universo. Conforme os IDEALISTAS, o espírito tem a primazia em tudo que se relaciona com o mundo e com a vida humana. Para os MATERIALISTAS o chamado espírito não é mais do que uma forma de atividade da matéria que, em determinada fase de sua evolução, de forma simples para outra mais complexa, adquiriu consciência, por um processo que a ciência ainda não conseguiu explicar, o que não seria evidencia de sua impossibilidade.
Para o NATURALISMO, o homem é meramente um produto da evolução, explicado em termos de pura natureza física e totalmente conhecido pelo estudo das disciplinas naturais. Para o SOCIALISMO, o homem é apenas um membro de seu grupo, totalmente dependente das normas da sociedade que produz. O homem, para o NACIONALISMO, é um mero participante da nação ou do Estado. Rousseau entendia o homem como naturalmente perfeito e perfectível. John Dewey, interpretando o seu naturalismo, sustenta que o homem é a continuação da natureza.
Tem-se perguntado constantemente qual é a essência verdadeira do homem. Para Max Scheler é o espírito que cria a si mesmo e ao mundo. Para outros, no entanto, é a razão que possibilita ao homem participar do mundo.
Para tantos, a essência verdadeira do homem é a alma, substancia imortal criada por Deus e que para ele deve voltar, cumprindo os planos da transcendência divina.
O caráter dependente da antropologia evidencia-se particularmente com as noções que definem as estruturas do homem e que são:
1) A noção de corpo define o homem como um organismo constituído, como um todo e uma unidade e não apenas a forma do organismo humano. O corpo define o modo de ser essencial e constitutivo do homem.
2) A noção de alma nunca designa uma parte do homem, mas o homem total, embora sob um aspecto determinado de sua manifestação vital.
3) A noção de homem implica em ser vivo e inteligente, pois sabe, compreende, conhece, orienta-se, quer, toma posição. Na inteligência está sempre incluído o elemento volitivo.
A existência de uma antropologia cientifica, de uma antropologia filosófica e de uma antropologia teológica, completamente distintas umas das outras, é a prova mais cabal de que o homem tem se tornado cada vez mais problemático. A inexistência de uma ideia clara e coerente do homem é uma constante.
O conceito de homem tem sido obscurecido e tem se tornado cada vez mais complexo, em virtude da infinidade de ciências particulares que estudam o homem.
A verdade é que o coroamento de todas as preocupações relativas ao homem, especialmente em termos de relações entre o individual e coletivo, este coroamento é encontrado na Antropologia Filosófica, disciplina que está voltada para o homem e sua vinculação com o mundo, no sentido essencialmente filosófico.
No cômputo geral, a função da Antropologia Filosófica é, como disse Max Scheler, na Conferencia intitulada EL PUESTO DEL HOMBRE EN EL COSMOS, apresentar a maneira como a estrutura fundamental do ser humano justifica as funções e as obras especificas do homem, desde a linguagem até a sociabilidade.
O centro do ser humano é o espírito e este tem posição primordial superior ao mundo e à matéria. Como centro do ser, o espírito reúne não somente a razão, mas também a emoção e a vontade. É ele que diferencia o ser humano das plantas e dos animais e é graças ao espírito que o humano quebra a rotina, tão comum aos animais, segue em direção oposta, procurando adaptar o mundo às suas condições.
A posição do homem é SUI GENERIS no universo. Para que o Ser Supremo viesse à terra, teve de tomar a forma de homem e não a de animais, vegetais ou minerais.
A Antropologia Filosófica de Descartes ensina que o homem é composto de alma e corpo. Este (o corpo), com as funções vitais inconscientes, é igual a uma máquina e por isto sujeito às leis da mecânica. Aquela (a alma), é puro espírito e sede dos fenômenos conscientes.
A Antropologia Filosófica de Max Scheler termina numa perspectiva metafísica e teológica em que Deus e homem se confundem.
Na Antropologia Filosófica de Tomas de Aquino, o homem é a união substancial da alma com o corpo. Este (o corpo) é o principio material. Aquela (a alma) é o principio imaterial. Ambos se formam como o ato à potencia, como a forma à matéria.
A Antropologia Filosófica de Leibnitz destaca no homem a alma humana que é uma substancia simples, uma mônada superior, espiritual, unindo-se ao corpo numa harmonia pré-estabelecida.
A Antropologia Filosófica de Kant destaca a existência da alma imortal que é também livre, porque sem liberdade não pode haver obrigação, nem moralidade verdadeira. A alma, no entanto, só se realiza no corpo, formando o ser humano.
Na sua Antropologia Filosófica, Spinoza acentua no homem a alma e o corpo como os dois aspectos de pensamento e extensão, sob os quais se concebe uma única realidade determinada.
A Antropologia Filosófica de Santo Agostinho se mostra hesitante, em virtude da influência platônica, ao analisar o problema da união entre a alma e o corpo para formar o homem. A dúvida sobre a origem da alma é notória, porque Agostinho oscila entre a ideia da criação imediata da alma e a ideia da transmissão da alma pelo processo generativo. A alma, conforme o Bispo de Hipona, é dotada de múltiplas faculdades.
Na Antropologia Filosófica de Demócrito, o homem é formado de corpo e alma, no entanto, a alma é composta de átomos semelhantes aos do fogo, porem muito mais sutis e entrelaçados em rede formam o corpo.
Em sua Antropologia Filosófica, Plotino defende um dualismo lógico-ontológico, que acentua a origem do homem, nas três hipóteses divinas que são: O UNO que é primeiro e o supremo. O NOUS que é a inteligência, onde estão as ideias e as causas. O PSIQUÉ que é alma. A partir daí Plotino que é uma espécie de síntese do pensamento grego, com as novas realidades da Era Cristã, argumenta que o corpo é o cárcere ou a sepultura da alma. Sua antropologia é fundamentalmente ética.
Em seu TRATADO DO DESESPERO, Kierkegaard focaliza a sua Antropologia Filosófica, ao dizer: “O homem é espírito. O que é, porem, o espírito? É o eu. E então, o que é o eu? O eu é uma relação que se relaciona consigo mesma. O homem é uma síntese de infinito e finito, de temporal e eterno, de liberdade e necessidade, em suma, uma síntese”.
A Antropologia Filosófica de Nietzsche está voltada para a ideia do super-homem, egoísta, ateu, tirano e as decorrências da negação de Deus e do próprio homem, como também outras chocantes contradições, entre as quais, destaca-se: “Super-homens, esse Deus tem sido vosso maior perigo”.
Jean Paul Sartre, em seu principal trabalho filosófico, intitulado o SER E O NADA, é responsável por uma Antropologia Filosófica em que a grande ênfase é “o homem tentando inutilmente se transformar em Deus, o Deus que é também um absurdo”, donde a sua conclusão de que só resta a náusea e a inutilidade de tudo e de todos. 
(FILOSOFIA DA CIÊNCIA, Goiânia, Oriente, 1979, página 183).




MÁRIO RIBEIRO MARTINS-ERA PROCURADOR DE JUSTIÇA E
ESCRITOR.

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