domingo, 20 de agosto de 2023

POEMA PORTUGUÊS 7

 



POEMA PORTUGUÊS 7

FERREIRA GULLAR (1930 - 2016)


Neste leito de ausência em que me esqueço

desperta um longo rio solitário:

se ele cresce de mim, se dele cresço,

mal sabe o coração desnecessário.


O rio corre e vai sem ter começo

nem foz, e o curso, que é constante, é vário.

Vai nas águas levando, involuntário,

luas onde me acordo e me adormeço:


Sobre o leito de sal, sou luz e gesso:

duplo espelho – o precário no precário.

Flore um lado de mim? No outro, ao contrário,


de silêncio e silêncio me apodreço.

Entre o que é rosa e lodo necessário,

passa o rio sem foz e sem começo.


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