terça-feira, 2 de setembro de 2025

ALFABETIZAÇÃO E LITERATURA NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO - MÁRIO RIBEIRO MARTINS

 






ALFABETIZAÇÃO E LITERATURA
NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO.


Mário Ribeiro Martins*


(REPRODUÇÃO PERMITIDA, DESDE QUE CITADOS ESTE AUTOR E O TÍTULO, ALÉM DA FONTE).



A educação permanente oferece hoje, sem dúvida, o marco no qual vai fundamentar-se a grande batalha da educação contemporânea, tanto a nível de reflexão científico - pedagógica quanto no nível da realização prática. Do ponto de vista da reflexão científico - pedagógica, a educação permanente está produzindo já - em todo o mundo um profundo movimento de reforma dos sistemas e meios educativos, assim como das estruturas que fazem possíveis.
Da perspectiva da realização prática, a educação permanente tem sido definida como Educação sem fronteiras, sem limitações, capaz e responsável, sua vez, de aglutinar qualquer contribuição que no mundo da família, do trabalho incida no melhoramento da pessoa, possibilitando uma vida mais humana numa sociedade mais justa. Mas uma educação durante toda a vida, para todos os homens e referente a todas as facetas do ser humano, isto é, educação integral.
Como concepção e estabelecimento, a educação permanente não é algo acrescentado à escolaridade, principalmente a obrigatória, em qualquer de seus níveis, senão que deve apresentar-se como princípio organizador de toda a educação.
Sem dúvida, é precisamente ao terminar a escolaridade obrigatória, quando começa realmente e adquire seu sentido estrito a educação permanente. O sistema educativo deve assegurar a unidade do processo da educação e facilitar a continuidade do mesmo ao longo da vida do homem, para satisfazer as exigências da educação permanente que requer a sociedade moderna.
Ainda que todo o sistema esteja estruturado na ordem da educação permanente como princípio organizador de toda a educação, é preciso distinguir entre o período normalizado de idades da estrutura educativa e, dentro do mesmo, o período de escolaridade obrigatória e o resto da vida das pessoas como período com permanentes possibilidades de educação.
Neste aspecto, afeta a mais de 60% da população de qualquer país e ao longo de dois terços da vida humana. A educação permanente, como realização prática, pode traçar-se a partir de várias posições.
Podem, por exemplo, seguir estudos equivalentes a quaisquer dos níveis educativos aqueles que, por qualquer razão, não puderam cursá-los oportunamente e, por conseguinte, têm ultrapassado as idades normais. Tem papel preponderante aí, como fator de incentivo, a literatura de modo geral.
Trata-se, portanto, de incorporar ao sistema educativo ou alcançar níveis equivalentes adquirindo os títulos acadêmicos e profissionais correspondentes, precisamente a todos os que não puderam em seu momento devido levá-los a cabo.
A divisão do sistema educativo adquire particular sentido porque, em grande medida hoje, se orienta o cultivo de pessoas que carecem dos mínimos padrões culturais desejáveis, isto é, satisfazendo as necessidades de uma educação básica, cujos objetivos essenciais poderiam sintetizar-se na possessão dos conhecimentos básicos das diversas áreas que o permitam conhecer e interpretar.
No domínio de técnicas instrumentais e desenvolvimento de hábitos de trabalho intelectual que possibilitam uma continuada auto aprendizagem; na aquisição da capacidade e hábito de autoavaliar o próprio processo educativo, como meio de continuar seu aperfeiçoamento de forma permanente estimando este processo como um dever diante de si e diante da sociedade, como caminho para lograr a autoestima e a estima dos demais.
Na valorização da dignidade pessoal e consolidação dos critérios e atitudes que conduzam uma hierarquização de valores, para dar um sentido superior a sua vida e satisfação, plenitude e alegria a sua existência.
O aperfeiçoamento, a promoção, a atualização e a readaptação profissional são também possíveis. Neste vertente profissional, a educação permanente trata de conseguir, a qualquer nível, a adaptação e ajuste do homem a sua profissão como modo de inserção social, forma de protagonizar sua existência e meio digno de obter o sustento para si e os seus.
Trata-se da constante colocação de objetivos no âmbito profissional, mediante a informação atualizada de tecnologias e métodos de trabalho, assim como a adequada assimilação dos avanços tecnológicos que facilitem, em seu caso, as trocas de emprego ou a readaptação profissional.
A promoção e a extensão cultural, a qualquer idade e em todo momento, são perfeitamente possíveis. O objetivo da educação permanente é conseguir a assimilação da cultura de nosso tempo, de sorte que possibilite a criação e o desenvolvimento de seus próprios recursos de vida, o gosto estético e uma explicação e compreensão racional do mundo atual.
Uma constante sensibilização que permite entender e interpretar pessoalmente os acontecimentos de nosso tempo e racionalizar as opções e atitudes das pessoas. Na verdade, tudo isso só é possível, se houver, de um lado, a alfabetização como infraestrutura, e do outro, uma visão da vida, do homem e do mundo, pelo contato constante com a literatura, como instrumento de alargamento dos horizontes.
A assimilação e compreensão favorecem o conhecimento de si mesmo e o desenvolvimento da natureza pessoal baseada numa segurança emocional, sentido da eficácia, prestígio, autoaceitação e em consequência, boa saúde mental, em qualquer idade da vida.
Todos estes aspectos têm de ser encaminhados na preparação para um comportamento convivencial e comunitário de integração e participação no que "fazer social" baseado no uso da liberdade humana.
Conseguir isto supõe a obtenção de uma atitude responsável e renovadora, de participação ativa na vida comunitária. O desenvolvimento do sentido de pertencer à comunidade local, nacional e internacional fomentando o espírito de convivência, solidariedade, compreensão e cooperação; revisão de opiniões, atitudes, prejuízos, feitos ou situações que falseiem ou tergiversem a ação conjunta social fazendo surgir formas e opções em função das classes, religião, raça, profissão etc.
Todos estes objetivos da educação permanente de adultos devem estar presentes para a obtenção da situação educativa em que o adulto se desenvolve e que são as seguintes: o caráter totalmente voluntário, livre, de pleno assentimento pessoal aos objetivos, conteúdos e técnicas de trabalho em que o processo educativo se desenvolve; as carências educativas, devidas, tanto ao rápido avanço científico e tecnológico quanto à crescente distância que, entre gerações, vão estabelecendo às modernas e profundas reformas educativas; sua condição de ser já comprometido por suas experiências que orientam de algum modo seu comportamento, frente à condição de ser disponível própria do indivíduo.
Os programas educativos, os esquemas organizativos e técnicas didáticas que se usem, deverão centrar-se em aspectos eminentemente formativos, tais quais, o domínio da capacidade de expressão, o desenvolvimento da capacidade de pensar e raciocinar corretamente, além da possessão de técnicas de trabalho individual e em grupo.
Indubitavelmente, a alfabetização num conceito mais ou menos amplo é a base de todo processo educativo e neste aspecto, a educação permanente de adultos supõe e comporta como fase prévia, uma alfabetização bem lograda. Até agora o conceito de alfabetização era um conceito restringido à consecução do domínio das técnicas instrumentais mais elementares da cultura, tais como a leitura, a escritura e o cálculo, que possibilitava o acesso à comunicação escrita e à utilização de expressões culturais mais simples, porém que sem dúvida, constituem a base para a continuação do processo educativo.
Dentro do contexto da educação permanente de adultos e dentro da dinâmica educativa atual, compartilhamos a opinião de que o conceito de alfabetização deve ser ampliado no sentido de domínio das técnicas instrumentais e básicas para alcançar o desenvolvimento da capacidade de pensar, raciocinar e tomar postura ante os problemas que a vida apresenta.
Neste sentido, evidentemente, se orienta o cultivo total da pessoa, seja qual for o meio ambiente, profissional, familiar ou comunitário em que se desenvolve, superando amplamente qualquer pragmatismo econômico. Isto não quer dizer que o processo educativo não apareça como um fato altamente rentável e condicionante básico de todo desenvolvimento social e econômico.
A estratégia da alfabetização se edifica sobre uma base amplamente realista e eficaz, intimamente conexionada com a realidade sócio - cultural que circunda o adulto, e, tende a facilitá-lo desde o primeiro momento, com esquemas, marcos de referência, modelos, ideais e informação suficiente que o permitam participar ativamente não só em seu próprio melhoramento, senão e essencialmente na promoção dos grupos primários e comunitários em que se inserta.
Dentro do contexto que aqui se apresenta, entende que a alfabetização supõe o conseguir, de forma ótima, os objetivos de uma educação básica generalizada, com um nível suficiente e satisfatório, de acordo com as características específicas da idade e condição do adulto. A não alcançar isto, a alfabetização cairia reduzida a um meio formativo praticamente encaminhado e intimamente relacionado à utilização desses sujeitos no esquema da produção agrícola e industrial e não a seu desenvolvimento humano que o permitia optar em sua promoção pessoal e profissional.
Há de se assinalar que no momento atual a alfabetização dentro do contexto da educação permanente de adultos, abarca a um ingente número de pessoas, já que os índices de analfabetismo, na maioria dos países, permanecem mui elevados, inclusive segundo as estatísticas mundiais, embora se observe que a percentagem de analfabetos tenha diminuído.
O intento de eliminar o analfabetismo e de conseguir altos níveis educativos para todos, alcança uma dimensão social que transcende a qualquer concepção o princípio individualista. Desenvolvimento pessoal e desenvolvimento social estão intimamente unidos e se condicionam mutuamente. Neste sentido, como objetivo social de nosso tempo, a educação tem de enfrentar a passagem de uma sociedade prevalentemente fechada a uma sociedade aberta.
A alfabetização no contexto da educação permanente e esta, no contexto de uma estrutura educativa aberta, se converte na base de todo o processo educativo, porém no caso dos adultos, é o único cominho para que possa alcançar as possibilidades que lhes oferece o sistema educativo e que não puderam utilizar nos anos iniciais de sua vida.
A acelerada transformação e o consequente desgaste dos conhecimentos, sinal característico de nosso tempo, outorga à educação permanente um significado, talvez mais importante, como meio imprescindível para uma boa comunicação entre os adultos e as jovens gerações.
Por isto é necessário que os adultos se sensibilizem ante a educação permanente, não só em termos de alfabetização, mas também em termos de conhecimentos literários, não somente como mera questão profissional, como às vezes se quer contemplar, senão mui especialmente como meio para não cair antiquados num mundo de mudanças e poder.
Comunicar com os jovens de sua sociedade, fazendo com que estas diferenças geracionais sejam menos possível e que, por profundas que cheguem a ser, se mantenha uma comunicação que permita o diálogo e evidente a estridência destas diferenças.
A alfabetização e a literatura no contexto da educação permanente constituem um alvo imprescindível para se conseguir uma convivência mais humana e, como se tem dito, é condição prévia para a amizade, a estabilidade e a compreensão entre os homens. (O POPULAR. Goiânia, 29.01.1978).




MÁRIO RIBEIRO MARTINS -  ERA PROCURADOR DE JUSTIÇA E ESCRITOR.


(LIVRO "CONFLITO DE GERAÇÕES")

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