NA URNA DA SAUDADE
Arita Damasceno Pettená
Mãe, não acordes o bebê
Que vive dentro de ti.
Quero viver na placenta
Que o amor a dois gerou.
Vês? Estou quietinha
Sorvendo, gota a gota,
Teu sangue que é vida.
Agasalha-me com tua palavra
Fazendo-me gente
Num mundo cheio de números.
Mãe, não acordes o bebê
Que vive dentro de ti.
Deixa-me sonhar de novo
Que a humanidade é criança
E a gratidão libera
As opções de um povo.
Ouço agora tua voz,
No aconchego de teu coração:
- é hora de passear lá fora, menina!
Mãe, eu te peço:
- Não me deixes ir embora.
Não acordes o bebê
Que vive dentro de ti.
Ideais de há muito se foram
Engolidos pela máquina
E a esperança dorme para sempre
Na Urna da Saudade.
(A FIGUEIRA, PÁGINA 4, MAIO/99)

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