quarta-feira, 6 de novembro de 2024

QUEM FOI CRUZ E SOUSA? - FILEMON MARTINS

 



QUEM FOI CRUZ E SOUSA?

Filemon Martins

 

João da Cruz e Sousa nasceu em 24/11/1861 em Desterro, atual Florianópolis, Santa Catarina. Nessa época, seu pai era pedreiro e ainda escravo, pertencente ao militar de nome Guilherme Xavier de Sousa (1818/1870), mas sua mãe já era alforriada e trabalhava como lavadeira. Desta maneira, a criança acabou recebendo o sobrenome do militar. A esposa do militar começou a ensinar a ler e escrever, como se fosse seu filho. Algum tempo depois, ele passou a estudar na escola do irmão dela e em 1872 ingressou no Colégio da Conceição, na época dirigido por Rozalina Paes Leme. Em 1874 foi aceito no Liceu Provincial de Santa Catarina.

Em 1877 tornou-se professor particular e publicou seus primeiros poemas em periódicos da época. Foi um dos fundadores do semanário Colombo, em 1881. Exerceu a função de ponto (pessoa que lembra as falas dos atores), na Companhia Dramática Julieta Santos.

Em 1883 tornou-se amigo do médico Francisco Luís da Gama Rosa (1851/1918), na época presidente da província de Santa Catarina, que, no ano seguinte fez do escritor o promotor público de Laguna. Não tardou muito, sua nomeação foi anulada. Cruz e Sousa, envolvido na causa abolicionista, decidiu conhecer a Bahia.

Em 1885, em Desterro, SC, dirigiu o jornal abolicionista O MOLEQUE. Em 1888 foi para o Rio de Janeiro, onde publicou poesias no periódico NOVIDADES.

No ano seguinte retornou a sua terra natal. A partir de 1890 fixou residência no Rio de Janeiro e passou a escrever para a Revista Ilustrada. Em seguida publicou textos na Folha Popular e em O Tempo. Em 1892 conheceu sua futura esposa Gavita Rosa Gonçalves. Em 1893 publicou seus livros: MISSAL E BROQUÉIS. Casou-se também com Gavita, tendo conseguido um emprego na Central do Brasil.

Muito doente, o poeta chegou a buscar tratamento para a tuberculose, na atual cidade de Antônio Carlos, em Minas Gerais, mas acabou falecendo em 18/03/1898.

Foi o poeta mais importante do Simbolismo brasileiro. Sua obra apresenta aspectos singulares, como o pessimismo, a predominância da cor branca, a temática social da época, e, como os parnasianos, o rigor formal, além de ter sido um abolicionista convicto.

Seus livros mais conhecidos são: Missal (1893), Broquéis (1893) e Evocações (1898).

Posteriormente foram publicados:

Faróis (1900);

Últimos sonetos (1905);

Poemas inéditos (1996)

Últimos inéditos (2013)

O poeta Cruz e Sousa teve uma vida atribulada, não só em razão do preconceito existente, mas por motivos de doença na família: seus filhos morreram prematuramente e sua esposa acabou ficando louca.

Mas a obra do poeta permaneceu, como estes sonetos:

TRIUNFO SUPREMO

Quem anda pelas lágrimas perdido,

Sonâmbulo dos trágicos flagelos,

É quem deixou para sempre esquecido

O mundo e os fúteis ouropéis mais belos.

 

É quem ficou do mundo redimido,

Expurgado dos vícios mais singelos

E disse a tudo o adeus indefinido

E desprendeu-se dos carnais anelos!

 

É quem entrou por todas as batalhas

As mãos e os pés e o flanco ensanguentando,

Amortalhado em todas as mortalhas.

 

Quem florestas e mares foi rasgando

E entre raios, pedradas e metralhas,

Ficou gemendo, mas ficou sonhando!

 

Ou ainda: INVULNERÁVEL

 

Quando dos carnavais da raça humana

Forem caindo as máscaras grotescas

E as atitudes mais funambulescas

Se desfizerem no feroz Nirvana;

Quando tudo ruir na febre insana,
Nas vertigens bizarras, pitorescas
De um mundo de emoções carnavalescas
Que ri da Fé profunda e soberana;

Vendo passar a lúgubre, funérea
Galeria sinistra da Miséria,
Com as máscaras do rosto descoladas;

Tu que és o deus, o deus invulnerável,
Resiste a tudo e fica formidável,
No silêncio das noites estreladas!

 

Mais: VIDA OBSCURA

 

Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro,
Ó ser humilde entre os humildes seres.
Embriagado, tonto dos prazeres,
O mundo para ti foi negro e duro.

Atravessaste num silêncio escuro
A vida presa a trágicos deveres
E chegaste ao saber de altos saberes
Tornando-te mais simples e mais puro.

Ninguém te viu o sentimento inquieto,
Magoado, oculto e aterrador, secreto,
Que o coração te apunhalou no mundo.

Mas eu que sempre te segui os passos
Sei que cruz infernal prendeu-te os braços
E o teu suspiro como foi profundo!

 

Como se vê, Cruz e Sousa foi o maior representante da Escola Simbolista, no Brasil. Letras iniciais maiúsculas, conservou o rigor formal, como a Escola Parnasiana, além dos temas abordados em seus sonetos, entre outros, o preconceito e o misticismo. Infelizmente, pouco se fala sobre o grande poeta de Santa Catarina, foi o que constatei em minhas pesquisas.   


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